Arquitectura Religiosa do Alto Minho II - Séc. XVIII ao Séc. XX

de: Lourenço ALVES

   
           
     
Excertos
"O Barroco no Alto Minho

O Alto Minho, reconhecido, desde sempre, como uma região pobre e abandonada pelo poder político, foi palco deste surto de construção barroca, tanto na arquitectura religiosa como na civil e militar.
Numa primeira fase, surgem-nos igrejas rurais, quase todas muito pobres, datadas da segunda metade do séc. XVII e da primeira do séc. XVIII, ainda muito entrosadas nos moldes renascentistas. São plantas simples de uma só nave ligada à capela-mor por um arco de meia volta - o arco cruzeiro. O altar-mor que, primitivamente, teria sido barroco, tipo nacional, foi substituído, há muito tempo, por outro neoclássico, simples e sem grande esforço artístico.
No exterior, salienta-se uma porta rectangular, com padieira levemente encurvada, uma cornija esquemática sobre a porta, um óculo redondo ou polilobado, a meio do frontispício, o remate em frontão triangular, com uma cruz simples no vértice, apoiada numa base barroca. Nos cantos, há pirâmides simples ou emboladas e as cornijas são côncavo-convexas, que nos contratos de construção eram apelidadas de papo-de-rola.
Numa segunda fase, além dos fiéis das paróquias, já intervêm outros encomendadores, quer de ordens religiosas, quer de irmandades das Misericórdias ou até mesmo de emigrantes brasileiros. Os primeiros substituíram as suas igrejas velhas pelo novo figurino; os emigrantes brasileiros, de torna viagem, com os bolsos a abarrotar de dinheiro, talvez fruto do mercado negro do ouro, traziam consigo desenhos ou pagelas, a fim de construírem na sua terra, uma igreja ou uma capela, isolada ou anexa a um solar, para saldar tantas dívidas morais contraídas nesses negócios escuros...
Foram as irmandades das Misericórdias que remodelaram as suas igrejas de Viana, Caminha, Cerveira, Monção, Arcos de Valdevez, Ponte da Barca e Ponte de Lima, dotando-as de belas talhas douradas. Foram as confrarias mais importantes, como a da S.ra da Agonia em Viana do Castelo, a do Espírito Santo de Paredes de Coura, a do Senhor dos Mareantes de Caminha, a da S.ra da Peneda que, a um templo já neoclássico, montaram à volta um cenário barroco, a do Senhor do Socorro na Labruja, a do Espírito Santo em Arcos de Valdevez, etc., que restauraram e construíram de novo igrejas cheias de beleza, umas ainda dentro da temática maneirista, outras já vincadamente barrocas, quer no recheio interior, quer nas formas exteriores. As portas com o dintel arqueado, ostentam uma guarnição de linhas quebradas muito ao gosto bracarense. Sobre a porta, desenha-se um frontão reduzido, que desenvolve em volutas fragmentadas. Sobre um janelão de contextura semelhante à da porta, dispõe-se um remate em forma de cortina fragmentada, ou em volutas enroladas, assumindo as formas mais caprichosas. Alguns templos mais ricos envolvem a fachada com duas torres também barrocas. Algumas ainda conservam no interior talhas preciosas.
Algumas igrejas paroquiais, sobretudo nas vilas, foram também construídas ou remodeladas nesta época, quer com o apoio das confrarias que ali tinham assento, quer com os óbolos dos fiéis. Estão, neste caso, a Sé de Viana, a Igreja de S. Domingos de Viana, a Matriz de Cerveira, a Matriz de Monção, a Matriz de Valdevez, a de Ponte da Barca, etc..

O Barroco em Viana do Castelo

Depois deste percurso tão longo pelo barroco, desde o crepúsculo do maneirismo até aos alvores do neoclássico, começando pela Itália e passando pelo nosso país, limitando-nos a fazer uma ou outra referência pontual a outros países, não porque não fosse importante, mas por acharmos desnecessário para o nosso objectivo, chegamos finalmente ao tema que nos propusemos tratar - o Barroco em Viana do Castelo.
Tudo o que se disse sobre o nascimento e a evolução do estilo barroco era fundamental para compreendermos as várias manifestações desta arte fantasista que, durante século e meio, espevitou a imaginação e a criatividade de tantos artistas que deixaram, na arquitectura, na escultura e na pintura, as marcas indeléveis do seu génio.
Viana do Castelo, vivendo num período áureo da sua história, usufruía de meios materiais mais que suficientes para alterar o seu acervo artístico que vinha do renascimento e, quiçá, da idade média.
E fê-lo com nível inusitado. Igrejas, palácios, construções militares formam um conjunto apreciável de monumentos que ainda hoje nos surpreendem e encantam.
Algumas das suas obras mais importantes ficaram no anonimato. Porém doutras conhecemos bem os seus autores.
Na transição do séc. XVII para o séc. XVIII, existiu em Viana um movimento artístico importante, no qual se incorporaram arquitectos e engenheiros, quase todos voltados para as construções de tipo militar. Foi este grupo dinâmico que fundou a Aula de Fortificação a que presidiu Miguel de L'École, engenheiro da província do Minho. Foi ele que formou alguns discípulos de grande craveira intelectual e artística, entre os quais brilhou, de modo especial, Manuel Pinto de Vilalobos que lhe sucedeu na chefia da Aula.
Pode-se considerar Manuel de Vilalobos um autêntico polígrafo na arte de desenhar. A ele se devem algumas obras importantes na cidade e arredores: a Igreja da Misericórdia, construída desde 1716, a capela do Palácio dos Távoras, actual Câmara Municipal, a Casa da Vedoria, na rua Manuel Espregueira, actual Arquivo Distrital, a Casa da Carreira, na rua do mesmo nome, a Casa dos Barbosa e Maciel, etc.
Fora do perímetro de Viana, Manuel Vilalobos é responsável pela Matriz de Ponte da Barca e, possivelmente, doutras obras cujos autores ainda estão por identificar.
Outro autor sem formação artística, mas que se notabilizou pela arte do desenho, e que muito fez em Viana e arredores foi André Soares.
A ele se devem os altares de talha dourada de Nossa Senhora do Rosário, na Igreja de S. Domingos, o altar de Nossa Senhora da Agonia, a fachada da Igreja da Caridade que foi construída segundo os moldes usados por este artista.
Fora de Viana, traçou o risco da igreja da Senhora da Lapa, em Arcos de Valdevez e da capela exterior do Calvário da Igreja Matriz da mesma vila.
Outro aspecto importante a considerar no período barroco, são os azulejos que, nesta época, recobrem as paredes das igrejas, ora de tapete, ora figurados. Alguns estão por identificar, quanto à sua autoria; outros, porém, estão bem identificados: os da igreja da Misericórida, de Viana do Castelo e da igreja da Montaria, deste concelho, que são obra prima de Policarpo de Oliveira Bernardes, fabricados na sua oficina de Lisboa."
 
 
     
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