Viana em 1517 - Urbanismo, demografia, sociedade

de: António Matos REIS

   
           
     
Excertos

"1- A PAISAGEM URBANA


1.1- O CENTRO MEDIEVAL


O concelho de Viana, em 1517, aparece-nos dividido em dois grandes blocos: a vila de Viana, sede do município, e as freguesias rurais que constituem o termo do concelho. No total habitam no município de Viana 1544 famílias, 711 na sede do concelho e 833 nas freguesias rurais. se adoptarmos a média de 4,1 membros por família, considerada normal para a época e que corresponde à que se consegue apurar com números concretos para 1561, Viana, em 1517, tem à volta de 6330 habitantes, sendo 2915 na vila e 3415 nas freguesias do termo.


a vila de Viana reparte-se em vários núcleos:a vila propriamente dita, situando-se no interior da muralha medieval, é constituída por um rectângulo, ou mesmo um quadrado, dividido em ruas e quarteirões, que correm paralelos ao rio e uns aos outros, na direcção nascente-poente. este traçado geométrico, que só não é totalmente rigoroso porque as suas linhas se amoldavam às curvas de nível do terreno, constitui um caso particular no nosso urbanismo medieval.


a mais próxima do rio, como o nome indicia, é a Rua do Cais. O facto de neste se concentrarem algumas das mais importantes operações económicas da povoação, explica que seja esta uma das ruas mais povoadas, nela vivendo 68 famílias, de vários escalóes sociais - e este convívio é característico de quase todas as ruas e espaços de Viana - , sendo a que no conjunto é habitada por um maior número de privilegiados (7), que cinclui 3 cavaleiros e 2 privilegiados com carta de armas. moram nesta rua os homens da governação: o juiz Martim Fernandes do Castelo, e, fruindo de privilégio na qualidade de "cidadãos", Gomes Rocha, MArtim da Rocha e Gonçalo Afonso Peixoto, e gente de maiores haveres, registando-se também a existência de 5 pobres, 7 ou 8 viúvas e 4 solteiras.


o meio da povoação é atravessado pela Rua Grande, assim chamada por ser a que apresenta maior largura, dando continuidade à estrada que vinha de nascente, do lado de POnte de Lima, e continuava para poente, na direcção do mar, flectindo para o lado de Caminha. É talves a rua mais povoada de todas, com 72 famílias, embora o número de habitantes pudesse não ser maior d oque o da Rua do Cais, porque nela vivia um maior número de viúvas (umas 24). na Rua Grande tem a sua casa um morador que goza do privilégio de carta de armas, o bem conhecido João Álvares FAgundes, havendo aí mais umcavaleiro e um outro privilegiado na qualidade de "cidadão", isto é, por fazer parte da governação local, que oe Gonçalo Pereira.


Entre as duas situa-se a Rua Cega, mais estreita e sombria, como o nome sugere (talvez se chamasse assim por não ter saída de um dos lados), habitada por um número mais reduzido de famílias, pertencentes, de um modo geral, a um modesto escalão social. é a rua onde vive o maior conjunto de pedreiros da vila.


a norte da Rua Grande situam-se as Ruas ditas de JOão Casado e do Tourinho, designações que apareceram numa data em que aí habitavam figuras conhecidas da povoação que usavam aquele nome e aqueles aspectos.


A Rua dita, em 1517, de João Casado chamar-se-á, em meados do século, Rua da Judiaria, ressuscitando um nome com que decerto fora conhecida antes, mas que, devido a acontecimentos ainda vivos na memória de todos (a perseguição aos judeus, a sua conversão forçada, e o aparecimento dos cristãos novos), em 1517 se poderia considerar execrando. Também aqui não vive qualquer privilegiado por títulos de nobreza ou similares. é, em número de habitantes (34), a terceira mais povoada dentro da vila.


De todas, a menos habitada é a Rua do Tourinho. REsidem nela 31 famílias, e predominam as pessoas de condição mais humilde, com um bom número de mulheres que viverão sozinhas (viúvas e solteiras).


No extremo norte da povoação, situa-se a Rua do Poço. Não é das mais habitadas (42 famílias) e isso dever-se-á ao facto de inicialmente apenas se erguerem moradias de lado sul, como sugere o seu perfil amplo e, para a época, a relativa modernidade das mais antigas casas do seu lado norte. Apenas um dos moradores goza de privilégio (de vassalo).


Não ha referências a arruamentos perpendiculares aos anteriores ou a outros, no interior das muralhas de planta arredondada.


Os espaços que se estendiam entre o rectângulo formado pelo conjunto habitacional e os muros destinavam-se a usos e a equipamentos colectivos: os Paços do Concelho, os mercados e os fornos, a feira (instituída em 1286), o Hospital e a Igreja, construída e logo ampliada na segunda metade do século XV.


Durante a Idade Média era proibido construir junto às muralhas. Levantada essa proibição por alvarás de D. Manuel, e transferida, no início do século XVI, a feira e os paços do concelho para o exterior da muralha, os espaços intermédios serão ocupados e preenchidos gradualmente por volta de 1530. É, aliás, desse modo, através dos processo relativos à sua privalitazão, que ficamos a saber que em data anterior esses espaços não estavam cobertos por habitações: em 1531, a Câmara põe em hasta pública o espaço situado entre a porta das Atafonas (entrada do lado de Ponte de Lima) e a torre do Cais, portanto no ângulo sudoeste da pvoação, e do mesmo modo os do lado oposto, no ângulo sudoeste, onde até então se situava o "açougue do pescado", isto é, o mercado do peixe, que foi transferido para o espaço contíguo no esterior das muralhas, onde permaneceria durante vários séculos. também o espaço localizado entre a igreja e a porta de Santiago, seria alienado, em troca do rompimento dos penedos que preenchiam essa área, onde presumivelmente se situaria o edifício dos Paços do Concelho. Contíguo a este ficaria já o espaço ocupado pelo forno ou pelos fornos ainda hoje indiciado pela topon+imia, e logo a seguir, a norte da Rua do Poço, a área destinada ao mercado dos cereais e à feira, em geral. No espaço existente entre o prolongamento da Rua Grande para poente e o ângulo noroeste da vila, foi construído, no séc. XV, o Hospital depos chamado Hospital Velho, para o distinguir do novo Hospital da Misericórdia, construído fora dos muros, depois de 1523.


Com o preenchimento dos espaços referidos, as ruas preexistentes prolongar-se-ão quase todas até às muralhas (a excepção é a Rua do Tourinho, que desembocava, de um lado, no Hospital Velho, e, do outro, na praça da Matriz), e, atravessando-as, em perpendicular, surgirão novos arruamentos, ainda não existentes em 1517: a rua "do Postiguo até à porta do CAmpo do Forno", e a "do Hospital (Velho)"."

 
 
     
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