Esta obra, prefaciada por Artur Anselmo,apresenta uma visão muito fresca e de carácter quase etnográfico das festas da Senhora d'Agonia.São cantadas as mulheres minhotas, a garridice dos seus fatos, o som dos bombos, do harmónio e do cavaquinho, as delícias de um vira bem dançado e, claro, a beleza do fogo de artifício.Faz-nos crescer água na boca com a descrição dos petiscos e odores que contribuem para a festa. Mas o poeta também canta as emoções, os desejos que cada um acalenta no meio da multidão.
EM LOUVOR DE VIANA
Vem daí, anda comigo,vamos ver Viana, os dois.Se eu mentir, dás-me o castigo,mas, se for mais do que eu digo,fazemos contas, depois...
Tu vais-te embora - é verdade -mas vais voltar novamentecativo desta beldade- como volta toda a gente...
Viana é um jardim floridode inimitável beleza,porque Deus - estou convencido -ou foi mesmo aqui nascido,ou mora cá, com certeza...
O Rio teima em ficarolhando a cidade lindae nem se lembra do mare nem sonha em ter de andar mais uns momentos, ainda...
Desde que o sol, num sorriso, a beija, numa promessa,a gente perde o juízoe pensa que o Paraísoé mesmo ali que começa...
E à noite, no desvariode um sonho que mal se expressa,sobre o decote do riobrilham as luzes do fiode contas, que o atravessa...
" O Roteiro das Festas D'Agonia, de Alfredo Reguengo,é um documento poético de assinalável importância, não apenas porque todas as suas composições denotam elevada maturidade formal e estilística, mas também porque se prendem com uma realidade histórica que, sendo embora recente, está, cada vez mais, fora dos hábitos e da mentalidade dos nossos dias. O desenvolvimento histórico, de facto, tem vindo a cilindrar implacavelmente tudo o que nas Festas d'Agonia, ainda em vida de Alfredo Reguengo, era já curiosidade histórica: os "cafés de lepes" à luz do carboneto, as velas dos copinhos de estearina, o "peixe frito sobre as sertãs das tendas de madeira", as bilhas de água "cumà neve", os "foguetes dos Silvas e Castros", a "carripana de anúncio à tourada", a moça que vendia tremoços em alguidar vidrado, o homem dos "milagrosos pós de duas coroas", a "barraca dum pobre retratista", os comes-e-bebes com loureiros no portal e mesas improvisadas sobre barrotes."
Artur Anselmo