A poetisa dos Acrósticos na noite balança, de forma epigraficamente concisa, pela arte do acróstico, entre um mundo disfórico – metaforizado no próprio título – que se desenha no campo semântico da morte, do desalento, da solidão, da saudade e um outro plano, de plena euforia, que se concretiza na abordagem de núcleos temáticos como o amor/paixão, a literatura (especialmente a palavra poética), a infância, a viagem. Paira sempre, qual tríade de agoirentas Parcas, a força imponente do Destino que conduz inelutavelmente ao Fim (Finalmente a noite chegou / Imperiosa e triste como só a / Morte sabe ser).
DESTINO
Disseram-me Em tempos...que o destino Sereno, persistente e Traiçoeiro Impera...e que Numa curva da vida está... Onde ninguém o espera.
LÁGRIMAS
Lamentos Antigos Gritos perdidos Revolvidos pelo vento... Indicações de Marinheiros...barca sem norte... Atribulada...tempestade de Solidão.
MITO
Minto se te Inspiro...se te falo de uma Terra distante e fresca Onde possas renascer
OBRA
O efeito da Brisa denunciando a Realidade nua...testemunha de Acção acabada
ONDA
Ontem Na Duna fresca Amando-te ao som rouco do mar...esqueci o tempo...
SER
Servidão Edificada sem Razão de ser
TEMPLO
Testemunha Envolvente Monumento Pertinente. Lugar sagrado... Oásis...
VIDA
Vivência Interdita a Doidos, poetas e Amantes.
Escrevi uma carta à autora após a leitura de "Os Acrósticos". Nessa carta, eu começava por dizer que a sua poesia era "secreta", vivida, envolvente e velada como se uma neblina a envolvesse e, por isso, inquietava a minha sensibilidade. Sublinhei que os seus poemas eram vivos, porque a vida pulsava neles e eu gostava de os ler. Hoje, ao relê-los, reencontrei naturalmente esses poemas ora como se os visse em estreia ora como se os revisse e me fizessem reflectir. Por um lado, os acrósticos, não sendo exigentes na rima e na regularidade do número de sílabas, são-no na obrigatoriedade de criar um nome de sentimento ou ideia, seguindo, no sentido vertical, a primeira letra de cada verso. Cito, como exemplos, neste caso: ENCANTO, ESTADO, INFÂNCIA, ONDA e, para terminar, um poema intenso e forte - VIDA, que transcrevo e muito aprecio. Vivência Interdita a Doidos, poetas e Amantes A propósito, já uma vez escrevi que "a Poesia é a alma da Vida". Repare-se que ela vive em todas as artes e até na Ciência como afirmou Einstein ao dizer que, quando estava próximo de uma descoberta, ouvia música. A Poesia, como todas as Artes, não pode medir-se (não há fitas métricas nem balanças para isso). O poeta sente, escreve e interpreta. Contudo um leitor pode ler, sentir e interpretar de modo diverso por não estar a par do conhecimento do acontecimento ou reflexão que originou o poema. Dois leitores nem sempre estão de acordo... Quantas vezes os críticos têm opiniões diferentes e os próprios poetas! Pessoalmente, considero que um Poeta, como todo o semeador de arte, semeando-a, sacia a sede quetem, como a La Salette. O leitor, se é amante da poesia, vai penetrando na intimidade que a sua leitura lhe permite compartilhar e, assim, vai também tornando-se menos sequioso.
Armando Pinheiro