Fernando Castro e Sousa, nos seus poemas de versos simples espelha uma sensibilidade do mundo que o rodeia, podendo encontrar-se uma variedade temática que vai desde a evocação da liberdade, a sensibilidade para com as misérias sociais, a preocupação com a fugacidade do tempo, a saudade, a insignificância do ser até ao amor.
EM ABRIL
Em Abrilfoi como se fosseem Santa Luzia,o monte,manhã de claro sol e bonançoso mar.
O ar estava despoluído,o horizonte ilimitadoe o verde,o verde nem azeitonanem esmeralda,o verde das árvores,das relvase das águas,era cântico profundode liberdade.
Em Abril,foi como se fosseincessantemente Abril,como se fossena pátria dos homense das mulheresque, serradas as amarras,ousavam o futuro.
ATÉ QUANDO A PRIMAVERA?
Vieste!Suave e cristalina,alvorecera Abril
as flores a abrir,a abrir,uma,mil
os pássaros ensaiando,ensaiando…
até quando?até quando?
BAIRRO CLANDESTINO
Bairro clandestino,bairro de meninomagricelas,a chapinharnos charcos nauseabundosdo destino.
Bairrosem saneamento,fedorento,com os ratosa sair dos buracose a fome a dobrar cada esquina.
Bairrode faca na meia,de copo no bucho,de porrada a fartar.
Bairro de incomodar!
TEMPO QUE NÃO PASSA
Às vezes são os casebres miseráveis do tempo miserável
e o tempo não passa! e o tempo não passa!
às vezes são os rostos esquálidos das crianças famintas
às vezes é somente o desespero dos milhões de queimados em napalm.
AQUI À TUA ESPERA
estou aqui sentado à tua espera
tanto infinito lavrado à minha frente
não vai tardar que venha a Primavera
e o hálito das rosas que na aragem se pressente
e sei que a vida é um tempo que pouco dura
olho estes prados outrora verdejantes
- e palmo a palmo semeio-os de ternura.
ENQUANTO RESPIRO
Enquanto respiro, as papoilas crescem entre os campos de trigo, vermelhas de coragem;
enquanto respiro, um veio de água irrompe cristalino da nascente e aventura-se pela vertente da montanha, curioso e destemido;
enquanto respiro, a esperança reacende-se nos mais recônditos lugares
e sob as povoações bombardeadas, um catraio distraído masca serenamente um chiclete.
CADA UM DE NÓS
Cada um de nós é só um grão de areia, o fumo de um cigarro, a rosa desfolhada.
Mas ferve-nos o sangue, de veia para veia e aspiramos sempre erguer a madrugada.
QUASE
Quase um anjo descendo dos teus cabelos.
Quase a vida em novelos de estremecidos ahs!!!
Quase o teu corpo suado nos abraços
…e a outra dimensão.
ESBOÇO
Devagar,esboço o teu perfil, onde a penumbra não ilude a claridade.
A cada traço, o traço mais viril, fiel à expressão da água quando arde.