Presépio de Pão (terceiro conto)
É quando as primeiras nódoas do bolor desgostam a última boroa, que Maria da Panificação ordena outra fornada. Madrugada, a mulher recordou ao marido a necessidade das aparas. "Boas como palha para acender o lume". - Afirmava. Nesse dia, porém, os vizinhos não diriam que José Tanoeiro carregava um pipo de fitas velhas e um feixe de lascas inúteis, para haver pão novo. Hoje, não. A Maria vai passar, mas é, a tarde à roda dos tachos. Que mãos para doçarias tem ela. Quem deixaria para agora cozer o pão? Daniel e Natália, ao meio-dia, recolheram o gado às cortes, mas não cobriram os estrumes com paveias de mato morto. A mãe, logo mais, da bosta vai servir-se para calafetar as frinchas da boca. Porta não há que detenha o vulcão de um forno. Mas o rito do pão não renega as cerimónias da quadra. Há-de haver batatas, bacalhau, nabos, couves, rabanadas, aletria, vinho doce e mel, pinhões. E, claro está, o pão fresco que às bocas se entrega como um puro beijo de amor. Mas presépio, em casa, jamais fora necessidade. Na escola, sim. "Todos os meninos que tiverem imagens - recomenda a professora - devem trazê-las". Decorriam as tarefas da artesanal panificação. A mãe, livrar-se dos impecilhos, só lhes dando uma acogulda malga de massa: - Cada um faz a sua bola. Mas vamos lá nós agora adivinhar: que podem as mãos de uma criança fazer com o engenho que lhes roda a cabeça? - Natá. Pst, ó Natá. Olha. - Olha, Niel. - Respondeu a irmã que língua solta ainda não tinha para o nome completo do irmão. - Quem é? - E o teu? Riram-se as crianças em seus pensamentos. Na palma das mãos cumpria-se a ternura da paz. - Vamos fazer um presépio? - Propôs Daniel. - E menino? - Deste resto de massa. A mãe coze-os antes de enfornar. Faremos um presépio de pão. - Onde? - Ali. - Apontou Daniel. - Depois da mãe retirar as boroas. Nem precisamos dos animaizinhos, não é? - É. O forno não deixa o Menino morrer de frio.