Esta separata do volume XVI dos "Cadernos Vianenses" apresenta um estudo sobre a origem e a evolução de Viana do Castelo. Estrutura-se em cinco capítulos, alguns dos quais ainda se subdividem. Assim, a leitura das vinte e duas páginas que compõem a publicação, oferece primeiramente ao leitor informações sobre "A implantação da Vila",município que nasceu por vontade e determinação régia de D. Afonso III que, em 18 de Junho de 1258, lhe outorga um foral, posteriormente reoutorgado em 1262 e as razões que motivaram a escolha da localização desse novo município. Ao focar "A povoação medieval", o autor centra-se na carta enviada por D. Afonso III ao seu emisário (que se deslocou a Viana com o intuito de promover o povoamento da vila), aos alcaides e ao concelho de Viana; nas muralhas que envolviam a vila e prováveis datas de construção e de ampliação; no aglomerado urbano e os primórdios da sua expansão extra-muros. Sobre "A Cidade Aberta", é focada a expansão demográfica e o incremento da actividade marítima, que acarretaram uma mudança na fisionomia de Viana: alteração dos seus limites, construção de novas ruas. Referem-se ainda aspectos de natureza social e económica (como a afluência e radicação de novos moradores, quer portugueses quer estrangeiros, que condicionarão o desenvolvimento ulterior da vila e farão acentuar as discrepâncias sociais e económicas), assim como a construção da fortaleza, durante o reinado de Filipe II de Espanha, com funções de defesa contra a pirataria e o saque dos ingleses. Seguidamente, António Matos Reis conduz-nos até aos séculos XVII e XVIII, para se deter em questões de ordem espiritual, como sejam as construções pertencentes à arquitectura religiosa, que despontam em Viana ainda no século XVI, para atingirem certa relevância no seguinte. Apresenta também as alterações que advieram da Restauração da independência, seja relativamente à economia local, seja quanto ao seu património arquitectónico militar e religioso. Merece destaque, nesta fase, o papel dos engenheiros /arquitectos militares, principais obreiros do traçado das fortificações defensivas que foram construídas na região do Alto Minho e, durante a governação do Marquês de Pombal, a fábrica de louça de Viana. No último ponto, o leitor é remetido para os séculos XIX e XX e, na sequência do estudo, o autor refere os melhoramentos arquitectónicos e viários a que a vila e depois cidade de Viana foi submetida (a escola primária Dr. Alfredo de Magalhães, o Palácio da Justiça,o teatro Sá de Miranda, a ponte Eiffel, a linha de caminho-de-ferro...) e o seu crescimento desordenado, verificado no último quartel do século XX, o qual tem vindo a ser corrigido pelo novo Plano de Urbanização, integrado no Plano Director Municipal.
Acompanham o estudo várias gravuras: uma reconstituição conjectural da vila na segunda metade do século XV; uma imagem, considerada a mais antiga da população; uma planta de Viana em 1759, outra de 1805 e outra ainda de 1980; e ainda uma vista aérea do centro histórico medieval, datada de 1992.
1- A IMPLANTAÇÃO DA VILA
Ao contrário do que sucedeu com a maioria das povoações portuguesas, Viana resultou não de uma concentração espontânea e gradual de moradores, que de ordinário se faz de uma forma casual e desordenada, mas de uma expressa vontade política, incarnada no rei D. Afonso III que, no foral assinado em 1258.06.18 e depois, com ligeiras alterações, reoutorgado em 1262, decidiu criar um novo município, cuja cabeça colocava num aglomerado (numa vila) no lugar de Átrio, a que atribuía a nova designação de Viana.De acordo com as Inquirições feitas na mesma data, Átrio correspondia a uma das três áreas em que se dividia a paróquia do mesmo nome e aí se localizava a sede paroquial. As outras duas eram as «vilas» de Castro e Figueiredo.Átrio constituía já um pequeno aglomerado habitacional, que tinha como componentes um reguengo agrícola e um ancoradouro, onde aportavam as embarcações. O movimento deste cais devia ser significativo, porque, em caso de guerra, tinha já uma certa expressão estratégica. Os moradores, diz-se, nessa contingência, «Vam sobre Gallecia um corpore Regis in quaes navios ouverem».Esta circunstância proporcionou o desenvolvimento deste local e, em conjunto com a sua posição central, contribuiu para que aqui se construísse a igreja e se localizasse a sede da paróquia.Na outra margem, situava-se Nossa Senhora das Areias, que, na mesma época, era, nas proximidades, ainda que não muito desenvolvido, o mais importante aglomerado da margem sul da foz do Lima. Também aí se desenvolveu uma actividade marinheira interessante, pois já na mesma data «am por foro que el Rey teyver y navios am d'ir de Douro ataes Minio». É entre Nossa Senhora das Areias e Átrio que se faz então a travessia do Lima.Estes factos ajudam-nos a compreender as razões que levaram a escolher o local para implantação de Viana: a proximidade da foz, e, ao mesmo tempo, a passagem do Lima.Perguntar-se-ia então porque é que a povoação resultante do foral afonsino foi implantada mais para juzante do aglomerado de Átrio, de tal modo que deixou inclusivamente de fora a mais antiga igreja.A razão está de facto na sua localização privilegiada, sob o ponto de vista funcional, estratégico e urbano: situava-se numa posição que reunia os requisitos necessários para um bom ancoradouro (águas com profundidade bastante, logo seguidas por um chão firme e seguro); desde o ribeiro do Ameal (e mesmo desde antes) até à foz, era esse o morro mais avançado sobre o rio, dispondo das melhores condições para a organização da futura defesa da povoação e do próprio ancoradouro; a descida em declive era uma garantia de salubridade, possibilitando uma boa exposição ao sol e um fácil escoamento das águas.Foi neste local que D. Afonso III pretendeu concentrar toda a população da paróquia de S. Salvador, dispersa pelas vilas de Crasto, Figueiredo e Átrio, dando-lhe o nome de Viana e transformando-a em sede de um novo concelho, organizado segundo os moldes do chamado «foral de Salamanca»."